Wednesday, January 25, 2006

Guitarra


A importância do violão e/ou da guitarra no jazz explica-se, em parte, porque este instrumento está situado numa posição peculiar dentro do espectro sonoro: trata-se de um intermediário entre os instrumentos puramente melódicos - como os sopros e os metais - e os instrumentos harmónicos - como, por exemplo, o piano - os quais, embora possam solar, geralmente são usados para fornecer a base para os solos. Essa posição intermediária permite à guitarra transitar entre solo e acompanhamento com naturalidade.
É comum distinguir duas eras da guitarra no jazz: antes e depois de Charlie Christian. Antes de Christian, a guitarra era meramente um instrumento acompanhador, no sentido estrito do termo: marcava o ritmo, da maneira mais simples possível, e expunha a harmonia para o canto. Embora fosse um instrumento tradicional, vindo do blues, não se achava, musicalmente falando, no mesmo plano que o piano, por exemplo. O professor de Christian, Eddie Durham, inventou a guitarra amplificada, que Christian adotou em 1937. No período de 1939 até 1941, tocando com Benny Goodman, e fazendo jam sessions com os futuros bebopers, Christian revolucionou a guitarra jazzística e estabeleceu um padrão que os guitarristas das décadas seguintes se esforçariam para atingir. Embora vindo do swing, viveu exactamente na transição para o tórrido estilo “Minton’s” que transformaria o jazz. A sua morte, em 1942, com tuberculose, interrompeu uma evolução que prometia ainda maiores inovações.
Outro guitarrista dos anos 30, solista por excelência, e que misteriosamente parece não ter absorvido quase nenhuma influência, é Django Reinhardt (falecido em 1953, aos 43 anos). Muito querido e admirado até hoje por todos os guitarristas, homenageado numa composição do Modern Jazz Quartet (“Django”) tinha no entanto, um estilo demasiado pessoal, desvinculado da evolução geral do jazz, e não gerou tantos seguidores directos quanto Christian. Também se deve notar que a técnica desenvolvida por Christian era mais adequada à guitarra eléctrica do que a de Django, oriundo do violão acústico e que aderiu ao som eléctrico apenas tardiamente.
Todos os guitarristas posteriores a Charlie Christian foram influenciados por ele. Entre os maiores, podemos mencionar o virtuoso Wes Montgomery, Kenny Burrell e Herb Ellis.
A guitarra participou da evolução do jazz, ao longo do swing, do cool e do bebop, às vezes desempenhando um papel musicalmente muito relevante, porém raramente na condição de solista e líder. A passagem da guitarra para o primeiro plano absoluto deu-se com o advento do jazz-rock, mais especialmente da fusion, e com o surgimento do mito Jimi Hendrix no rock. Vemos então firmarem-se virtuosos como John McLaughlin (provavelmente o maior guitarrista dessa fase), Larry Coryell, George Benson (sucessor de Wes Montgomery, na técnica e no tipo de repertório) e Pat Metheny (que atirou em diversas direcções, além da fusion: folk, free e maintream. A técnica da guitarra no jazz varia: a maior parte das vezes ela é tocada com palheta, o que limita sua capacidade melódica.
Alguns grandes virtuosos (como Joe Pass) tocam com os dedos, à maneira do violão clássico. Recentemente, Stanley Jordan tornou-se famoso com uma técnica que amplia o potencial da harmonia, dedilhando o braço do instrumento com as duas mãos, como num teclado de piano; o som é emitido apenas pelo choque dos dedos contra as cordas. Assim, desaparece a limitação de ser obrigado a construir a polifonia no braço do instrumento usando apenas a mão esquerda; o guitarrista passa a ser capaz de executar baixo, harmonia e melodia simultaneamente (sem a necessidade de overdubbing).
A constituição física do instrumento também varia. Ele pode ter o corpo maciço, como na célebre Fender Stratocaster e suas descendentes (algumas de design bastante bizarro), onde o sinal eléctrico é gerado directamente pelo movimento da corda metálica dentro do campo magnético do captadores. Ou pode ter o corpo oco, como na igualmente célebre Gibson ES-5 e suas derivadas, acrescentando às vibrações directas da corda também um complexo padrão de realimentação acústica e vibração por simpatia, que altera os modos de vibração recebidos pelo captador, e portanto o timbre resultante. Em geral, as guitarras semi-acústicas são deixadas sem distorção, com o timbre mais puro, e são preferidas pelos guitarristas de jazz mais tradicionais, enquanto que as maciças têm a preferência dos guitarristas de fusion, que lhes conectam uma variedade de distorções, efeitos e pedais.
Contrabaixo


O contrabaixista é considerado, pela maior parte do público, ainda que inconscientemente, como sendo “aquele sujeito lá no fundo do palco”. Simpático, porém secundário. Muitos contrabaixistas já se queixaram dessa ideia preconcebida. E, de fato, essa imagem está bastante longe da realidade no jazz moderno. Como veremos, o papel do contrabaixo é bem mais complexo.
Nos primórdios do jazz a função de executar a voz grave da trama harmónica e polifónica era executada por um instrumento de sopro: a tuba. Essa tradição permaneceu por algum tempo, mesmo após a emergência do contrabaixo; até meados dos anos 30 ainda havia contrabaixistas que tocavam também a tuba.
O facto de, diferentemente do que acontece na música clássica, o contrabaixo ser sistematicamente tocado no jazz em pizzicato (isto é, dedilhado, quando na realidade o instrumento foi concebido originalmente para ser tocado com arco) tem uma origem histórica documentada. Certo dia, em 1911, Bill Johnson, que tocava contrabaixo (com arco) na Original Creole Jazz Band, partiu o arco. Não tendo outro à mão, Bill tratou de tocar dedilhando as cordas com os dedos da mão direita. O resultado agradou tanto que desde então (quase) nunca mais se usou o arco para tocar este instrumento. Na verdade, é provável que, mais cedo ou mais tarde, o contrabaixo começasse a ser tocado com os dedos - isso por causa da função estrutural que ele executa dentro do conjunto de jazz. E aqui, existem dois aspectos importantes.
Primeiro, e mais óbvio, o contrabaixo tem a função de fornecer a base harmónica da música. Na harmonia tonal, é preciso que um instrumento se encarregue de fornecer a nota fundamental dos acordes. Nesse sentido, o contrabaixo do conjunto de jazz preenche uma função análoga à que desempenha na orquestra ocidental clássica. Sob esse aspecto, portanto, o contrabaixo poderia ser tocado com arco. Mas, em segundo lugar - e este é um aspecto próprio ao jazz - o contrabaixo está incumbido de escandir, isto é, subdividir, o ritmo básico. Isso reduz a trivialidade da batida (beat) simples, embora seja importante que o beat continue perceptível, pelo menos implicitamente. Para isso, em vez de simplesmente emitir as notas fundamentais dos acordes nos momentos exactos, o contrabaixo descreve um fraseado contínuo, caprichoso, com subidas, descidas e saltos. Esta pulsação às vezes lembra o caminhar relaxado de uma pessoa, daí o termo walking bass. Para executar essa função, o contrabaixo dedilhado é infinitamente mais adequado do que o contrabaixo tocado com arco. Na verdade, o contrabaixo tem um papel importantíssimo no estabelecimento do swing da música, tanto quanto a bateria. Ele contribui para a maleabilidade, a elasticidade rítmica que caracteriza o swing.
Nomes como Jimmy Blanton, Charles Mingus e Paul Chambers fazem sem dúvida alguma parte da história do contrabaixo.
Bateria


A bateria sofreu uma transformação radical nos anos 40, pelas mãos de Sidney Catlett, Kenny Clarke e Max Roach. De um papel secundário, com uma função de simples marcadora de tempos, como acontecia no jazz tradicional e (com raras excepções) no swing, a bateria passou a dialogar com os outros instrumentos. O fraseado também se alterou, passando a incorporar batidas no contratempo e figuras rítmicas irregulares inseridas dentro do ritmo básico. A partir do hard bop, com Max Roach e Art Blakey, a bateria tornou-se solista e mesmo líder de conjuntos. Encontramos grandes bateristas da actualidade desempenhando esse papel, como o saudoso Billy Cobham e Jack DeJohnette.