Thursday, December 29, 2005


Miles Davis (1926 - 1991)

Trompete

Miles Davis efectivamente que constitui, sozinho, um capítulo à parte dentro do jazz. Pode-se dizer que ele foi uma verdadeira força propulsora do jazz durante mais de quarenta anos. O seu som de trompete, puro, macio e quase sem vibrato, o uso da surdina, e o seu fraseado conciso tornaram-se marcas registradas. Dono de uma personalidade difícil, às vezes contraditória, também foi fundador do cool jazz, do jazz modal, do jazz rock e da fusion, Miles fez da renovação das linguagens o principal impulso gerador de sua música. A sua carreira, começou dentro do bebop, apresentou uma fase brilhante já em 1948-1950, com a formação da célebre Miles Davis-Capitol Orchestra, onde o genial compositor Gil Evans começou a escrever verdadeiras obras-primas que davam todas as condições para a expressividade de Miles. A colaboração Miles-Evans continuou ao longo dos anos 50. Os arranjos de Evans não têm lugar em nenhuma big band: tratam-se de peças impressionistas, com estruturas elaboradas, texturas timbrísticas sofisticadas, revelando influências variadas que incluíam, por exemplo, a música espanhola. Paralelamente ao trabalho com Gil Evans, Miles dava, a partir de 1949, os contornos ao nascente estilo cool, eminentemente apropriado à sua maneira intimista de tocar, gravando as sessões intituladas Birth of the Cool.De 1956 em diante, Miles lidera um quinteto / sexteto que, através das suas várias formações, entraria para a história do jazz. Para se ter uma ideia dos talentos envolvidos, inicialmente o quinteto contava com o saxofonista John Coltrane, o pianista Red Garland, o contrabaixista Paul Chambers e o baterista Philly Joe Jones; esta formação gravou a série de discos intitulados Relaxin', Workin', Steamin' e Cookin'. Com a entrada do sax alto Cannonball Adderley, o conjunto transformou-se num sexteto que gravou Milestones. Em 1959 Red Garland foi substituído por Bill Evans e Wynton Kelly, que se revezavam ao piano, e Jones cedeu o lugar a Jimmy Cobb, no sexteto que gravou um dos discos mais cult do jazz de todos os tempos, Kind of blue. Com esse grupo, Miles começou a explorar o jazz modal, usando combinações harmónicas mais livres do que a harmonia tonal tradicional, e improvisando mais sobre os acordes do que sobre a melodia do tema. Em 1960-1961, houve pequenas mudanças, mas a base era mantida: ora Cannonball Adderley cedia o lugar a Sonny Stitt ou Hank Mobley, ora Jones voltava a assumir a bateria; o grupo também se podia reduzir a um quinteto, com apenas Coltrane ao tenor.
Paralelamente ao trabalho com quinteto e sexteto, Miles retoma a colaboração com Gil Evans e grava (respectivamente, em 1958 e 1960) duas obras-primas absolutas com orquestra:Porgy and Bess e Sketches of Spain.
Em 1964 surgiu uma formação inteiramente nova do sexteto, com George Coleman ao sax tenor, Herbie Hancock ao piano, Ron Carter ao contrabaixo e o brilhante adolescente Tony Williams à bateria. (Hancock, Carter e Williams ocasionalmente foram substituídos, respectivamente, por Frank Butler, Richard Davis e Victor Feldman). Em 1965 a chegada do talentoso saxtenorista e compositor Wayne Shorter dá consistência ainda maior ao grupo. Ao lado de Shorter, Hancock, Carter e Williams, Miles grava discos como E.S.P., Miles Smiles, Sorcerer, Nefertiti e são recolhidos notáveis registros de concertos ao vivo no Plugged Nickel Club de Chicago (hoje restaurados totalmente, constituindo aquilo que Richard Cook e Brian Morton denominaram "a Pedra de Roseta do jazz moderno").
No final dos anos 60, Miles encaminha-se para mais uma renovação estética, começando a fazer experiências com a fusão entre jazz e rock. Nessa fase, fica novamente em evidência uma faceta de Miles que já se havia manifestado com o quinteto dos anos 50: o descobridor de talentos. Para formar os seus conjuntos de jazz-rock, Miles convoca os pianistasHerbie Hancock,Chick Corea e Joe Zawinul, os bateristas Tony Williams e Jack DeJohnette, os contrabaixistasDave Holland e Ron Carter, o guitarrista John McLaughlin, o saxofonista Wayne Shorter, o organista Larry Young, entre outros. O jazz-rock, do qual Miles se estava a aproximar gradualmente com os discos In a Silent Way e Filles de Kilimanjaro, nasce efectivamente com o revolucionário (e ainda hoje moderno) álbum duplo de 1969, Bitches Brew.

Com Live/Evil, de 1970, e alguns outros discos até 1972, encerra-se uma fase na carreira de Miles e tem início outra, ainda mais controversa que a de Bitches Brew. Durante os anos 70 e 80, Miles continua a fazer experiências com a integração de linguagens, renovando complectamente os seus grupos com músicos pouco conhecidos, afastando-se do jazz (mesmo do jazz-rock) e aproximando-se do funk até do hip-hop. Mas, como se trata de Miles, nem por isso tal fusão se torna trivial ou comercial. Embora as opiniões se dividam acerca das obras desse período, o som de Miles continua inconfundível, a sua poderosa mente musical continua claramente no controle.
Em 28 de setembro de 1991 o trompete de Miles silencia. A sua obra vasta, multifacetada, evolutiva, desbravada, ora hermética, ora lírica - irá certamente fornecer material para análise e motivo de puro deslumbramento para muitas gerações.

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